Abell 370 e os Vermes do Céu

Ivan de Souza 3.8.18
Acreditem, não é uma estória de trancoso ou conversa de pescador mas, em um passado não muito distante, havia alguns astrônomos que tinham preconceito, raiva e até marginalizavam os asteroides, isso mesmo! a rejeição por parte desses astrônomos era tão grande que chamavam aqueles objetos celestes de "Vermes do Céu".
Imagem: NASA/ESA
Era uma vez, nos anos 1970 e 1980, astrônomos que chamavam os asteroides de "Vermes do Céu", o mesmo desprezo que hoje algumas pessoas cometem quando chamam os bombos de "ratos com asas". E por que isso? Diziam eles que esses "vermes" eram pequenos objetos que atrapalhavam a astronomia séria. Suas queixas é que eles bagunçavam as imagens, deixavam traços, pontos etc e astronomia série entenda como os planetas, galáxias..


Compare isso quando se quer fotografar um belo pôr do sol porém há ao seu redor um bando de mosquitos que insistem em aparecer em sua inesquecível imagem.

Embora, obviamente, é bem irritante quando sê está tentando observar galáxias em um ponto do Universo e um monte de asteroides sem nome a apenas alguns milhões de quilômetros de distância "trolam" sua imagem como papagaios de pirata, hoje desprezar esses objetos surpreendentes e perigosos seria desdenhoso e incoerente.

Essa imagem (acima) mostra o incrível aglomerado de galáxias Abell 370, localizado a impressionantes 4 bilhões de anos-luz de distância, e que contém várias centenas de galáxias. Tem sido observado pelo telescópio espacial Hubble muitas vezes por muitas razões, uma das quais é mapear as lentes gravitacionais. A gravidade do aglomerado dobra o espaço de forma tão severa que a luz das galáxias ainda mais distantes se deforma e distorce, criando longos raios de luz manchados. Esses arcos podem dizer aos astrônomos muito sobre a própria galáxia de origem e sobre o aglomerado que faz as lentes.

Todos esses arcos que você vê são galáxias de fundo lente-gravitacionalizadas, prontas para análise. Mas essa é a versão limpa da imagem; essa análise é muito mais difícil de fazer quando asteroides entram no caminho! Veja como é essa imagem antes dos asteroides serem limpos (original):
Imagem:NASA/ESA
Um tanto confusa, não?

Normalmente, os asteróides observados da Terra produzem pequenos riscos nas imagens (ou uma série de pontos, dependendo do tempo de exposição). Mas com o Hubble, as coisas são diferentes. Está em órbita, então o próprio movimento aumenta o movimento de um asteróide, fazendo com que esse traço se curve. Isso é chamado de paralaxe, quando a posição de um objeto distante depende da posição do observador. É a mesma coisa quando você segura o polegar no comprimento do braço e pisca primeiro o olho esquerdo, depois o direito, e o polegar parece mudar de posição contra o fundo devido à mudança de perspectiva.

Pior, a faixa que o asteróide faz depende da orientação da órbita de Hubble. Se a órbita é perpendicular ao asteroide (então o círculo da órbita está voltado para o asteroide) o asteróide se move para frente e para trás à medida que o Hubble se move, e o resultado é uma curva alongada em forma de S (como um sinal integral). Se a órbita do Hubble estiver voltada para o asteroide, você terá um arco de curva simples. Você pode ver ambos na imagem (que é uma composição de muitas, muitas exposições curtas tiradas durante diferentes períodos do ano, então a orientação da órbita do Hubble muda em relação ao cluster).

E todos esses arcos se parecem muito com as galáxias com lentes, não são? Você pode perceber a diferença depois de um momento de estudo; os arcos com lentes gravitacionais são sempre perpendiculares ao centro do aglomerado de galáxias, por exemplo, e tendem a ser mais espessos. Mas ainda assim, é melhor remover os asteróides. Isso não é muito difícil de fazer. Eles só aparecem em uma única imagem e várias imagens do mesmo ponto são tiradas. Você pode limpá-los dessa única imagem à mão (o que é tedioso) ou pode aplicar técnicas matemáticas inteligentes como recorte de mediana (também chamado de recorte de sigma), que elimina pixels que são significativamente mais brilhantes em uma imagem do que as outras.

Aqui está uma animação antes e depois que fiz usando essas imagens:



Felizmente essa rejeição foi abandonada no meio cientifico, logo se deram conta o quanto é importante a pesquisa sobre os asteroides, Astrônomos são humanos e como humanos eles erram também e como humanos têm a capacidade de se corrigirem.

Pesquisador, entusiasta da ciência, e divulgador cientifico. Autor de vários sites e blogs de Ciencia, entre eles o Astrumphyca.org.. Ateu, é defensor fervoroso do secularismo na educação e na politica.

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